30 de ago. de 2013

Hibridização: desterritorialização e reterritorialização da educação e cultura


"A noção de uma cultura autêntica como um universo autônomo e internamente coerente não é mais sustentável."

“Certas mudanças nas normas institucionais, nos currículos e na pedagogia, parecem cruciais para a democratização das instituições de ensino na próxima década.”

Em “Culture & Truth: The Remaking of Social Analysis” (ROSALDO, 1993), os temas propostos centram-se no multiculturalismo e nas vantagens acadêmicas da diversidade nas salas de aula, possibilitadas pela composição heterogênea dos alunos (homens, mulheres, gays, lésbicas, brancos, amarelos, negros etc), pela proposição de novas leituras _ para além dos canônicos da literatura _, e ainda pela interdisciplinaridade de cursos nas disciplinas básicas (antropologia e etnologia), aos moldes da Universidade de Stanford, onde Renato Rosaldo é professor de antropologia e cultura. 
“A reconstrução da análise social em Cultura e Verdade, foi inspirada pelas lutas travadas dentro das instituições, por seus membros.” (ROSALDO, 1993)


No capítulo “Nostalgia Imperialista”, o autor coloca o quanto somos “enganados” em nossas reminiscências culturais pela nostalgia e faz um paralelo entre o sentimento pueril provocado pelas lembranças da infância e o passado histórico / cultural obtuso que se esconde sob o mesmo disfarce inocente. Isso de certo modo, influenciou no desenvolvimento social das nações, em primeira análise a americana, que impiedosamente, segregou e subjugou o florescimento de outras formas de cultura, à sua própria.

“A nostalgia imperialista gira em torno de um paradoxo: uma pessoa mata alguém, e depois lamenta a vítima. De forma mais atenuada, alguém deliberadamente altera uma forma de vida, e depois lamenta que as coisas não tenham ficado como eram antes da intervenção.” (ROSALDO, 1993)

O autor reacende a discussão sobre o processo civilizatório a partir do resgate da história dos Ilongots _ tribo que (ainda) habita o sul de Sierra Madre e Montanhas Caraballo, no lado leste da ilha de Luzon, nas Filipinas, que foi tomada por exército _, através do olhar de seu algoz, o tenente Wilfrid Turnbull, um tenente da Polícia que durante a primeira década deste século, passou algum tempo entre os Ilongots (1909 e 1910), quando foi em busca dos homens que assassinaram um etnógrafo americano chamado William Jones. O autor se vale das citações de Turnbull (publicadas na Philippine Magazine, 1929), para analise do conteúdo textual com a construção de virtuosa crítica antropológica, etnológica e cultural.   

Rosaldo discute o papel dos antropólogos na evolução do ensino, sob o ponto de vista da cidadania cultural e da democracia educacional. Propõe um novo padrão de reorganização educacional, mais abrangente e multicultural, o que remete a uma reterritorialização cultural. O autor resolve assim, deliberadamente, a desterritorialização proporcionada pela perda da relação da cultura com os territórios geográficos e sociais, que foram as marcas deixadas pelo imperialismo econômico e cultural.

Os dispositivos utilizados pelo imperialismo ainda reverberem na produção científica, artística e comunicacional, pois se mantem onipresentes na nossa memória histórica, através dos marcos históricos presentes na trama visual da cidade e do excludente e segregador modelo de ensino. 

Para Moreno1, a interlocução entre a universidade, a arte e os movimentos sociais são "mobilizadores de subjetividades e políticas de resistência". Ele pontua aspectos sobre a expansão dos ditos signos artísticos como ação transformadora da realidade e cujas relações são "transitivas com o meio ambiente", o que faz emergir novos mapas e representações do fazer arte. Para ele, “é providencial pensarmos como nossas ações e reações cotidianas são, de fato, dilatações corpóreo-artísticas de uma organicidade complexa que (se) engendra (m) na cidade”.

Hegel desenvolveu uma idéia acerca da formação cultural como uma criação artística.  Mas dentre os arquitetos e designers da nova arte moderna, Mondrian foi o maior entusiasta da confluência entre desenho industrial, estética racionalista e o ideário de uma obra de arte total, um projeto de transformação social, de organização da vida individual e coletiva, como um novo sistema de valores éticos e sociais e como o sistema de uma civilização nova, concebida como um todo. O Pós-moderno inaugurou a reprogramação terapêutica e compensadora de identidades sociais, paisagísticas ou culturais, a implantação compulsória de símbolos de identificação ou a criação de espaços alternativos de comunicação. (...) O simulacro cultural dos meios de comunicação gerou novos sistemas de socialização e modificação da conduta.

Quando Whilhelm Richard Wagner, compositor alemão do século XIX, falava em “obra de arte total” em sua obra intitulada “Das Kunstwerk der Zukunft” ou “A Obra de Arte do Futuro”, propunha a convergência entre as linguagens artísticas produzindo um espetáculo completo. Para o compositor as artes não deveriam estar isoladas umas das outras, já que o homem é um ser de linguagem. A “obra de arte total” proposta por ele, considerava uma teoria global para todas as artes, indo na contramão dos limites impostos pela Arte até o século XIX, que considerava apenas as linguagens artísticas de forma separada.

O poder do simulacro reside na vida industrialmente programada que se revela uma perfeita criação artística: suplanta a existência cindida do homem moderno, sua consciência negativa, suas visões de desamparo e as esperanças de felicidade que só delas nascem, por sua réplica artificial, ao mesmo tempo artística, tecnológica e industrial, e configurar o espetáculo de sua vida, da sociedade ou da cultura como a única alternativa de sobrevivência.

A hibridização pode ser explicada dentro de dois processos fundamentais, sendo:
  1. quebra e a mescla das coleções organizadas pelos sistemas culturais;
  2. desterritorialização dos processos simbólicos e a expansão dos gêneros impuros.
Destas analises desvenda-se as articulações entre modernidade e pós modernidade, entre cultura e poder. Contudo, a vida urbana transgride a cada momento essa ordem. No movimento da cidade, os interesses mercantis cruzam-se com os históricos, estéticos e comunicacionais. As lutas semânticas para neutralizar, perturbar a mensagem dos outros ou mudar seu significado, e subordinar os demais à própria lógica, são encenações dos conflitos entre as forças sociais: entre o mercado, a história, o Estado, a publicidade e a luta popular para sobreviver.

As buscas mais radicais sobre o que significa estar entrando e saindo da modernidade são as dos que assumem ás tensões entre desterritorialização e reterritorialização. Com isso surgem dois processos, a:
  1. perda da relação "natural" da cultura com os territórios geográficos e sociais;
  2. certas relocalizações territoriais relativas, parciais, das velhas e novas produções simbólicas.
      
     Renato Rosaldo aponta como meio para costurar esse apartheid, a hibridização intercultural que revalidaria as identidades, atualizando e aproximando continentes, globalizando-os.




1    O psiquiatra austríaco Moreno in A cultura como obra de arte total.




Referência bibliográfica:
ROSALDO, Renato. Culture & Truth: The Remaking of Social Analysis. Beacon Press, 1993



29 de ago. de 2013

Rio de Janeiro: arquitetura importada e conforto


         
O novo modelo arquitetônico prevalente nos bairros da zona oeste do Rio de Janeiro _cujo sótão habitável é um dos principais determinantes formais_, redesenha os condomínios de alto padrão e se apoia nas regras insanas do mercado imobiliário. Simetricamente, os ocupantes dos novos espaços terão que arcar com o ônus de uma arquitetura importada, criada para outras realidades climáticas. 

O sótão habitável é uma solução que permite aproveitamento total do espaço construído, o que em tese é bom para quem vende e também para quem compra. Mas, será que esse tipo de construção é a mais adequada para regiões quentes como o Rio de Janeiro?

O telhado alto, com inclinações acentuadas, mansardas, bay-windows e telhas tipo shingle é um sistema construtivo nativo de países frios, cuja finalidade vai muito além do aproveitamento do sotão.

A inclinação adotada tem a função de escoar a neve, de modo a não acumular e criar um sobrepeso na cobertura. Em períodos ensolarados, o telhado recebe a principal cota de calor, que será armazenado entre a cobertura e a subcobertura e transferido para os demais ambientes deixando a casa quentinha. As janelas tipo bay-windows tem aberturas discretas para não escapar calor e as paredes recebem revestimentos térmicos tipo clapboard (pré moldados em concreto, madeira, PVC etc). Tudo para atender uma arquitetura de alta inércia.

O clima na cidade do Rio de Janeiro tem amplitude térmica relativamente baixa, com verões quentes e úmidos e invernos amenos e com poucas chuvas. Em áreas mais urbanizadas é comum o efeito "ilha", com temperaturas acima dos 40°C. Esse tipo de clima requer construções de média à baixa inércia, ou seja, que tenham paredes finas para trocas rápidas de temperatura e aberturas generosas com barreiras físicas para proteger do sol, mas que permitam que o vento transpasse todos os ambientes.

O telhado para as construções em regiões quentes como o Rio de Janeiro é um item realmente importante, já que em horários de sol intenso a temperatura da cobertura pode chegar a 70°C.

Historicamente, o telhado que se convencionou utilizar no Brasil era definido pelas condições climáticas e limitação na oferta de produtos. As telhas tipo capa e canal, moldadas nas coxas dos trabalhadores determinava a inclinação do telhado nos limites da sobreposição estável das peças. Os beirais foram projetados para jogar a água para a rua e para o quintal. Uma subcobertura de palha ou tiras de madeira criavam um colchão de ar no sótão para bloquear a passagem de calor para o ambiente. Eram simples, porém eficientes.

Hoje colocar telhado na edificação não é regra, mas quando adotado, é definido pelas condições climáticas da região, tipos de telhas disponíveis (telhas de barro, metal, plástico, amianto, vidro, zinco, concreto, palha etc), regime de ventos, índices pluviométricos e principalmente, pela estética (telhado clássico, neoclássico, colonial, normando etc).

A admissão do chalé ou de suas variações com telhados habitáveis, requer analise dos aspectos ambientais e também econômicos, considerando que o custo desse tipo de arquitetura não termina com sua construção. O maior custo está na manutebilidade do imóvel, gerado pelo uso intensivo de ar condicionado para climatização artificial dos espaços. Outro custo, será para iluminamento dos ambientes, já que o aproveitamento da iluminação natural é limitado pelas pequenas aberturas que também não deixam ver a paisagem natural carioca, farta em todas as visadas. A forma da cobertura ainda dificulta a instalação de placas solares para aquecimento de água e de placas fotovoltáicas para produção de energia, desprezando uma potencial e abundante fonte natural de energia, o sol. E por fim, quando se divide o espaço com o reservatório de água, o incomodo do barulho deve ser minimizado com a instalação de isolantes acústicos.

Em resumo, do ponto de vista climático, o chalé é tão adequado para o Rio como seria ir de casaco para a praia num dia de verão. 

A escolha do partido arquitetônico deve ser confrontada também, com a necessidade de poupar os recursos naturais pelo bem comum. Se a escolha, contudo, não for pelo planeta, que seja para conviver em harmonia com o clima e entorno natural da cidade do Rio de Janeiro.

27 de ago. de 2013

Design da emoção

"Para o bom design é preciso equacionar técnica (para aplicação de materiais, tecnologia etc) e emoção.  O usuário é fonte inesgotável e valiosa de inspiração, sem o qual a indústria não cria novos produtos, materiais e tecnologias para a arquitetura e o design de interiores." (KOCH, 2013)

Sempre que o designer de interiores intenciona aproximar o resultado final do projeto à expectativa do cliente, a percepção do usuário é considerada. Tudo que é visto e tocado provoca uma sensação e uma resposta. Então, a percepção (resposta) que é uma atividade mental inerente, em alguma medida está presente em todos os projetos. Mas, interpretar algo que passa pela subjetividade é desafiador e vai além de entender a necessidade física e funcional de uma pessoa. E também, não se trata de vasculhar intimidades para descobrir emoções inauditas e sonhos inconfessos. 

Então, como incorporar ao projeto processos que provoquem sensações e reações positivas que reflitam na qualidade de vida das pessoas?

As sensações devem ser planejadas, tomando como princípio resgatar a cultura, os costumes e a tradição. Reminiscências individuais, que serão resgatadas pelo designer e devolvidas às rotinas familiares no convívio com seu espaço. 

fonte de inspiração 
Para definir a «fonte de inspiração» dentre tantos materiais disponíveis, é preciso entender como o usuário sente e percebe os estímulos sensoriais recebidos. Através da percepção, o indivíduo organiza e interpreta as suas impressões sensoriais para atribuir significado ao seu meio. De modo simplificado, a percepção consiste na aquisição, interpretação, seleção e organização das informações obtidas pelos sentidos.

O conceito de percepção enfoca as energias do ambiente que atuam nos órgãos sensores de um indivíduo: olhos, ouvidos, nariz, língua, pele, músculos e em seu sistema nervoso central. Bartley (apud KOCH, 2009) definiu percepção como “reação discriminatória imediata do organismo para os órgãos sensoriais ativadores de energia”, onde “discriminar é escolher uma reação em que as condições contextuais têm o papel decisivo”.

Nos ambientes, a percepção está ligada ao resultado visual que será processado pelo usuário. Toda ação formal ou funcional em um ambiente está relacionada a uma resposta perceptiva.  Quando se propõe um projeto, deve-se considerar a interface do olhar e dos demais sentidos que atuam para compreensão do espaço envoltório.

Para Ferrara (1986), a relação interpretante está relacionada com a elaboração de um juízo perceptivo do observador, quando este constrói sobre determinado objeto uma interpretação e utiliza como parâmetro a experiência armazenada. Já Lynch (1988) divide as imagens entre as de topo e de base, sendo que as primeiras são responsáveis pelos volumes construídos para serem vistos a longa distância enquanto que as de base, de certo modo, normatizam o uso do espaço livre e impõem aos usuários códigos de postura. Derivações isoladas, todos concordam que o ambiente é local de intensa troca sensorial, com potencial capacidade para influenciar no comportamento (KOCH, 2009).

E nesse sentido, os estudos da relação ambiente X comportamento envolvem outras áreas, como o conforto visual, acústico, térmico, antropometria e o luminotécnico. Na área de arquitetura e design de interiores, a percepção ambiental possui papel preponderante na comunicação do espaço construído.

atributos sensórios e atributos técnicos 
A percepção do usuário está relacionada aos atributos sensórios de cada material. Então, na delimitação dos espaços e na escolha dos materiais, tecnologias e equipamentos prevalecerá a expectativa sensorial do cliente.

Um material tem atributos e associações percebidas que conferem personalidade _ou não_, quando combinados em um produto. Manzini (apud ASHBY, 2011) ilustra como a combinação de material e forma é usada para obter atributos de produtos e respostas humanas específicas. Cada material tem um atributo estético que está relacionado diretamente com seus atributos técnicos (ASHBY, M.F., 2011).

O metal, por exemplo, é frio ao toque porque dissipa o calor do dedo rapidamente. Isso acontece porque o metal apresenta boa condutividade térmica, enquanto o contrário acontece com materiais percebidos como quentes ao toque (Quadro 1).



Quadro 1 - Atributos sensórios e técnicos dos materiais
(ASHBY, 2011)

Esses atributos interessam ao designer de interiores, porque cada material deve ser adequadamente utilizado, em acordo com o caráter do ambiente, o clima e a cultura do lugar e principalmente, com o usuário. Logo, revestir piso de dormitório com um material frio, como o porcelanato, ao tato não será a melhor escolha para uma casa na montanha. A madeira seria a opção esperada. Mas, porque não sugerir um revestimento de cimento polimérico, que ao tato é “morno”, já que em sua composição tem cimento estrutural, polímeros e impermeabilizante acrílico?

A escolha dos materiais é, portanto, uma tarefa complexa e técnica baseada nos processos e materiais que melhor satisfaçam às condicionantes climáticas e requisitos sensórios. Será equacionada ainda, por fatores econômicos e por aspectos ligados à sustentabilidade e tecnologia. O designer enfim, deve apresentar soluções criativas que satisfaçam todos os aspectos apresentados, com técnica e emoção.


Trecho extraído do livro "Design para interiores - Técnica para emoção: Cozinhas e Home Theaters" (KOCH, 2013)


Referência Bibliográfica:

ASHBY, M.F. Materiais e Design: Arte e ciência da seleção de materiais no design de produto / Michael Ashby e Kara Johnson. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011
FERRARA, L. D'A. A estratégia dos signos. São Paulo: Perspectiva, 1986
KOCH, Mirtes B. Parques Urbanos Sul-americanos: Imaginação e Imaginabilidade. (Dissertação mestrado, FAU USP), 2009
___________. Design para interiores - Técnica para emoção: Cozinhas e Home Theaters. Rio de Janeiro (Ebook Amazon), 2013

Parque Metropolitano – Santiago, Chile: Percepção da cultura na geografia do lugar

Gabriela Mistral definiu a Cordilheira dos Andes como “o tórax do corpo geográfico chileno”.  Pais de paisagens diversas, o Chile guarda sob seu território ilhas oceânicas, o deserto do Atacama e gentes mapuche¹.

Vista aérea da Cordilheira dos Andes (autora)
            A topografia tortuosa que segue linearmente à Cordilheira, acomoda sobre a vegetação escassa os senderos íngremes que percorrem as esbranquiçadas cadeias montanhosas ou cerros, desafiando a gravidade para dar acesso as tradicionais casas de madeira cobertas com canas, mais conhecidas como Ruka. Subir as 58 curvas do sendero que vai de Santiago até o Vale Nevado, ouvindo  "huasos" e "rapanui" (géneros musicais típicos da cultura local), imerso na imensidão de branco e azul, é uma das várias experiências  sensoriais só possíveis no Chile.

As tradicionais casas Mapuche "Ruka" (autora)

Vale Nevado (autora)
          Em Santiago, o Parque Metropolitano é a principal área verde da região. Formado pelos cerros San Cristóbal, Manquehue e Bosque Santiago _que até 1921 eram terras descobertas e de muitos donos_, foi unificado e teve recompostas suas matas. Hoje é considerado o  principal “pulmão” verde da metrópole, com suas árvores gigantes. Se um dia os druidas (sacerdotes celtas), tentaram recriar na arquitetura gótica suas florestas sagradas povoadas por espíritos da natureza, aqui é o retorno da ideia original. O parque é uma catedral, nesse lugar onde o céu está quase sempre encoberto pela poluição que acinzenta a atmosfera e oblitera as cores da paisagem.

Vista da cidade através do mirante oeste do Parque Metropolitano (autora)

O parque ganhou além da vegetação, equipamentos que valorizam seu potencial topográfico, como o funicular e o teleférico. O funicular é um trenzinho que se desloca pelos trilhos na subida docerro, a caminho da imagem da Inmaculada Concepción de la Virgen María que fica no topo do morro, enquanto o outro vagão desce do outro lado com a força de sua oposição.

Vista da cidade através do mirante oeste do Parque Metropolitano (autora)

O teleférico atravessa o parque de norte a sul, com pontos de embarque e desembarque em vários topos de montanhas. Sobrevoar o parque dentro de uma cabine teleférica é uma situação impar, que coloca o espaço de forma integral e reforça referencialmente a percepção do observador que se dá conta da enormidade do parque e sua relação intrínseca com a cidade.

Vista do parque e da cidade através do teleférico (autora) 
            Os marcos visuais do parque são da cultura Mapuche, que possui uma cosmovisão integral muito própria, onde a natureza e o homem conformam conceitualmente uma unidade. Menos presente no léxico do castelhano local, o  quechua awqa  aparece nomeando zonas, ruas, equipamentos e lugares públicos e alguns relativos à fauna e a flora autóctones. Em 1932, Gabriela Mistral descreveu a importância do início das obras do San Cristóbal, no sentido de ter colocado no mesmo nível de importância o Conquistador Don Pedro de Valdívia e o Cacique Toqui Vencido ou Caupolicán, principal herói de La Araucana do poema épico de Alonso de Ercilla y Zúñiga.

      “A raça é mais espanhola que aborígene, pela glorificação que o índio magnifico significa para nós, em vez de censura rancorosa de uma derrota, a lição soberana de defesa do território é obra de um espólio eterno da dignidade nacional. La Araucana, que para muitos segue como sendo de centauros das ordens, romanos e índios para os chilenos, no passado é um duplo testemunho, paterno e materno, da força do sangue, aplacadas e unificadas em nós mesmos.”(MISTRAL, 1957)

A abrangência da herança histórica está entremeada entre apelos materiais e principalmente imateriais, na geografia do lugar. A cultura chilena, pela carga cognitiva e identitária que possui, impregna essas paisagens que reforçam ainda mais a identidade local.



¹  No dialeto quechua awqaMapuche significa “terra da gente”.


Memória Perceptiva

Será que as lembranças se apagam com o tempo, perdendo um sentido de cada vez? Ou será que o sentido mais estimulado será mantido por mais tempo na memória? Ou ainda, que a criança vê em blocos de forma sincrética, como afirma a psicologia da percepção?
Segundo a psicologia da percepção, o sistema nervoso central da criança ainda está em desenvolvimento e a aquisição perceptiva está intimamente ligada à maturação neural, associada ainda as estratégias aprendidas. Existem inúmeros estudos e experimentos que buscam mensurar no desenvolvimento das percepções tátil, olfativa, gustativa e auditiva, a parte inata e a aprendida. No entanto, hoje a maioria dos pesquisadores concorda que já nascemos com algum repertório genético que será ampliado e aprimorado ao longo dos anos. (SIMÕES e TIEDEMANN, 1985)
Dentre os trabalhos dedicados a estimulação tátil, o mais conhecido foi registrado entre os séculos XIX e XX, com crianças com menos de um ano que eram encaminhadas a orfanatos. Elas desenvolviam uma doença conhecida na época como “marasmo”, causado pela falta de manipulação e de estimulação tátil através de contato físico, carinhos e embalos que resultassem em estimulação cinestésica. Concluíram que a carência desses estímulos produzia alterações nas células, glândulas e músculos.
Quanto à percepção auditiva, existem poucas informações, mas as referências experimentais dão conta que recém-nascidos apresentam capacidade de diferenciar fonemas (pa, ma) e de localizar sons e atribuir intensidades com reações físicas. 
Sobre a percepção olfativa e gustativa sabe-se que recens nascidos tem a capacidade de escolher odores dispersos no ar, voltando sua cabeça para os agradáveis e desviando dos desagradáveis. (SIMÕES e TIEDEMANN, 1985)
Em síntese, o olfato tem forte relação emocional e com a memória, o cheiro é a forma de reconhecer objetos ou de ajudar outros sentidos na identificação dos mesmos, como exemplo o paladar que precisa do olfato para examinar o alimento. A audição, além da comunicação oral é responsável pelo sentido do equilíbrio. O ouvido possui estruturas especializadas que fazem a distinção entre sons graves e agudos que quando deslocados, provocam o desequilíbrio do corpo. Então, para melhor ouvir, é preciso estar parado. Todos os sentidos convergem para o tato que é o maior dos sentidos, com área de aproximadamente 2m² de superfície e 5 milhões de células sensoriais. O espaço é percebido pelo corpo todo, e a informação do meio repercute no sistema háptico. 
A visão, por ocupar cerca de 87% de atividade entre os cinco sentidos, dá a impressão de que a realidade é o que vemos. A percepção visual é a mais estudada e oferece amplo material sobre o tema com abordagens sobre os níveis de percepção gradativos da visão, como a configuração dos objetos e dos seres; a visão do volume pelo jogo de luz e sombra e a sensação de peso pela textura e padrão. Os tipos de visão monocular (animais) e binocular (humanos), a fisiologia da visão e o espectro eletromagnético entre outros. (OKAMOTO apud KOCH, 2009)
Rudolf Arnheim (1998) explora inúmeras abordagens da psicologia visual e confirma a interface neural, inata e aprendida no processo de visão, quando explica a fisiologia do olhar. 
“A imagem ótica da retina estimula cerca de 130 milhões de receptores microscopicamente pequenos e cada um deles reage ao comprimento de onda e à intensidade da luz que recebe. Muitos destes receptores não desempenham seu trabalho independentemente. Conjuntos de receptores constituem-se em sistema neural. De fato, sabe-se, pelo menos, através dos olhos de certos animais, que tais conjuntos de receptores retinianos cooperam na reação a certos movimentos, bordas, tipos de objetos. Mesmo assim, alguns princípios ordenadores são necessários para transformar a infinidade de estímulos individuais nos objetos que vemos.” 
A percepção é também influenciada pela cultura e pelo ambiente geográfico, mas existem muitas considerações como as diferenças biológicas e fisiológicas de grupos éticos ou culturais. 
Alguns estudos apontam para diferenças de percepção entre indivíduos de olhos claros e escuros. Os povos que habitam regiões geográficas quentes possuem em geral olhos de coloração escura, o que se constitui numa adaptação seletiva que possibilita a esses indivíduos suportarem a claridade intensa. A coloração da íris é acompanhada também por uma pigmentação amarelada nos meios ópticos o que provoca uma redução na discriminação das cores na faixa azul-violeta. Em determinadas localidades da África, não existe definição linguística para essas cores. Já os olhos claros, geralmente encontrados em regiões geográficas geladas, permitem uma pequena difração dos raios de luz fazendo com que certas ilusões visuais, que dependam da nitidez, tenham maior índice de erro. 
A percepção é diferenciada nas duas pontas da vida. As modificações devido a lesões ou deterioração fisiológica dos órgãos da percepção provocam alterações nos demais órgãos dos sentidos, como um meio estratégico de suprir a limitação. Rappaport (1985) declara os órgãos dos sentidos como sistemas perceptivos plásticos, uma vez que adaptam-se ao habitat e as funções de cada indivíduo. (RAPPAPORT apud SIMÕES, Edda A. Q.TIEDEMANN, Klaus B.)

Referência Bibliográfica:
ARNHEIM, R. Arte e percepção visual. Uma psicologia da visão criadora. São Paulo: Pioneira, 1998
FERRARA, L. D'A. A estratégia dos signos. São Paulo: Perspectiva, 1986
KOCH, Mirtes B. Parques Urbanos Sul-americanos: Imaginação e Imaginabilidade. (SIMÕES, Edda A. Q.TIEDEMANN, Klaus B. Psicologia da Percepção. São Paulo: EPU Dissertação mestrado, FAU USP), 2009
LYNCH, K. A imagem da cidade. São Paulo: Martins Fontes, 1997

PARK, R. E. A cidade: sugestões para a investigação do comportamento humano no meio urbano. In: VELHO, Otávio Guilherme (Org.).O fenômeno urbano. 2 ed. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1973, 1985

Cidades do ontem

O livro “Cidades do Amanhã” (HALL, 2005), conduz o leitor a uma reflexão sobre o panorama da arquitetura mundial. Analisa cidades como Londres, Nova York, Chicago, Paris e Brasília a partir da leitura de projetos e de obras literárias e levanta questões arquitetônicas e sociológicas fundamentais para compreensão da cidade contemporânea. A literatura e as expressões artísticas em geral, resgatam importantes partes da história e os elementos imagéticos, pictóricos, fílmicos e textuais produzidos pelas artes são por excelência, referenciais históricos e comportamentais.

Um levantamento para caracterização de determinada informação, abrange diferentes tipos de analise e leitura, em que seja possível a sua conceituação etimológica (origens e história), denotativa (a que se encontra no dicionário) e conotativa (aquela que é entendida de forma corrente), lançando mão para isso do universo das artes.

O resgate das cidades do ontem através das artes é amparado na produção de intelectuais, pintores e demais artistas que pensaram suas realidades dentro de um recorte temporal e espacial por eles vivenciado e é mais que uma aventura poética. E se o campo de investigação é a cidade, os filmes possuem vasto acervo a ser pesquisado. A sétima arte além de guardar o passado, também especula sobre as cidades do amanhã e de como seria o "fim".

Os filmes repositórios das cidades brasileiras do passado surgiram ainda no século XIX, embora a indústria cinematográfica tenha se estruturado a partir do século XX, quando surgiram os primeiros estúdios cinematográficos no Rio de Janeiro. Em São Paulo, na década de 1950 foi implantada a Companhia Cinematográfica Multi Filmes em Mairiporã e a Companhia Cinematográfica Vera Cruz em São Bernardo do Campo, das quais ainda existem títulos disponíveis com temas urbanos onde a abordagem é principalmente a metrópole mecanizada.

Para a caracterização dos parques urbanos na dissertação de mestrado “Parques Urbanos Sul-americanos: Imaginação e Imaginabilidade” (KOCH, FAU|USP, 2009), a literatura nacional ofereceu subsídios para a compreensão dos aspectos morfológicos dos parques pesquisados. “O Tempo nos Parques” de Vinícius de Moraes (O Encontro do Cotidiano, 1986, p 235), registra:

“O tempo nos parques é íntimo, inadiável, imparticipante, imarcescível.
Medita nas altas frondes, na última palma da palmeira
Na grande pedra intacta, o tempo nos parques.
O tempo nos parques, cisma no olhar cego dos lagos
Dorme nas furnas, isola-se nos quiosques
Oculta-se no torso muscular do fícus, o tempo nos parques.
O tempo nos parques gera o silêncio do piar dos pássaros
Do passar dos passos, da cor que se move ao longo.
É alto, antigo, presciente o tempo nos parques
É incorruptível; o prenúncio de uma aragem
A agonia de uma folha o abrir-se de uma flor
Deixam um frêmito no espaço do tempo nos parques.
O tempo nos parques envolve de redomas invisíveis
Os que se amam; eterniza os anseios, petrifica
Os gestos, anestesia os sonhos, o tempo nos parques.
Nos homens dormentes, nas pontes que fogem, na franja
Dos chorões, na cúpula azul o tempo perdura
Nos parques; e a pequenina cutia surpreende
A imobilidade anterior desse tempo no mundo
Porque imóvel, elementar, autêntico, profundo
É o tempo nos parques.”

A poesia resume percepções acerca de pequenas manifestações sensoriais, a quintessência dos parques para Vinícius de Moraes e de certo modo, conceitua o ideal paisagístico para parques urbanos do período, com suas paisagens pastoris e seus extensos gramados. Espaços plácidos que obliteravam o tempo e que incutiam uma atitude passiva e contemplativa do usuário, nesse caso o autor. O parque descrito é um espaço sem registros, de “redomas invisíveis”, talvez porque tivesse destituído o urbano e todos os referenciais que são marcadores de tempo na cidade, revelando então sutilezas como, ruídos, ventos, cores, texturas e perfumes.

Mesmo um resgate poético deve ser contextualizado. O Livro de Vinícius de Moraes “Poemas, Sonetos e Baladas”, ilustrado com desenhos de Carlos Leão foi lançado em 1946 _período que o autor era vice-consul do Brasil em Los Angeles, Califórnia (EUA)_, relata a vivência do autor com paisagens de parques urbanos americanos, como exemplo o Central Park de Nova York, criado por Frederick Law Olmsted. No entanto, confrontando com a contextualização formal \ projetual dos parques nacionais ficou evidente a aplicação dos conceitos de Olmsted, revelando que alguns parques nacionais nasceram “contaminados” pelos ideais hegemônicos dos países centrais, que sempre permearam o campo da arquitetura e do urbanismo. As palavras de Olmsted reforçam as de Vinícius de Moraes:

“...não costumo classificar mais do que vinte delas como parques. Pois reservo este termo para lugares que se distinguem não por possuir árvores, sejam elas isoladas, em grupos ou em maciços, ou por possuírem flores, estátuas, estradas, pontes ou ainda, coleções disso ou daquilo. Reservo a palavra parque para lugares com amplidão e espaço suficientes e com todas as qualidades necessárias que justifiquem a aplicação a eles daquilo que pode ser encontrado na palavra cenário ou na palavra paisagem, no seu sentido mais antigo e radical, naquilo que os aproxima muito do cenário.”  (Olmested, 1983)

Nesse caso, reviver o parque através de outros olhares colaborou para encaminhar as leituras considerando a hipótese de simulacro.



Referência Bibliográfica:
HALL, Peter. Cidades do Amanhã. São Paulo: Perspectiva, 2005
MERLEAU-PONTY, Maurice. In: O olho e o espírito. Textos selecionados; seleção de textos Marilena de Souza Chauí; tradução e notas Marilena de Souza Chauí e Pedro de Souza Moraes. São Paulo, Nova Cultural, 1989.
MORAES, Vinícius. O Encontro do Cotidiano, p 235, in Biblioteca Luso-Brasileira - Série Brasileira. Poesia Completa e Prosa, Rio de Janeiro: Editora Nova Aguilar SA, 1986, 787 pEsta epígrafe agrupa todas as composições publicadas no livro intitulado: “Poemas, Sonetos e Baladas”.
OLMSTED, Frederick Law. Creating Central Park 1857-1961. Baltimore: The John Hopkins University, 1983
KOCH, Mirtes B & Minami, Issao (orient)– Parques urbanos sul-americanos: imaginação e imaginabilidade . São Paulo: FAUUSP, Dissert. Mestrado (Trabalhos Programados), 2009
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Cidade Social: Arquitetura sustentável

O problema ambiental é mais grave e sistêmico que se possa resolver apenas através da arquitetura vernacular, mas qualquer bom projeto deve aproveitar as potencialidades do terreno, do entorno, do clima, da paisagem, da cultura e da família que irá habitar. Tudo que se sobrepõe ao espaço, camada por camada e principalmente, respeitar o que a natureza desenhou: inclinação, rocha aflorada, água subterrânea e árvores, para que a arquitetura seja mais que um passivo ambiental.

Nenhum processo se sustenta sozinho. Na construção civil ele se inicia no projeto e perdura por muitas fases até a conclusão e por muitos anos até o perecer do edifício. São muitos elos que se conectam para que a nova construção pertença ao espaço e dele usufrua, e são as formas de realização dessas ligações que irão definir o nível de impacto ambiental. Em síntese, um edifício convive com o entorno e quanto menor for o respeito pelo pré-existente, maior será o alcance dos problemas, que na mesma ordem afetarão a rua, a quadra, o bairro ou a cidade.

Afora os esforços para melhorar o aproveitamento das fontes de energias naturais (sol, água e vento), diminuir os impactos da produção de berço-a-berço e para normatizar e certificar produtos e processos na construção civil, ainda se carece de uma comunhão de interesses para resultados mais amplos e consistentes. Mas as tecnologias de mídias digitais vãos aos poucos refinando a comunicação entre as cidades através das pessoas, apressando a condição atual de cidade hi-tech para a condição ideal de cidade social. O acesso e disseminação da informação e a possibilidade de expressão de pessoas que anteriormente não tinham voz, tem poder de apressar soluções.

A palavra sustentabilidade está em quase todas as propagandas da televisão: na do banco que economiza papel não enviando extratos aos clientes; na universidade cujos alunos criam nos laboratórios novos usos para os equipamentos eletrônicos ultrapassados e anteriormente descartados; nos supermercados que deixarão de produzir e distribuir 7 milhões de sacolas plásticas ao ano; entre tantas outras. Está na imprensa falada, nos jornais e revistas, nos folders de propaganda, nos livros e nos discursos.

A internet faz eco de tudo que acontece tornando o mundo mais rapidamente consciente quando as coisas não vão bem. E ainda que os principais poluidores apontem mais para as benesses atualmente realizadas _ já que as ações de marketing trataram de converter as soluções sustentáveis em um sub-produto do produto que agrega valor ao mesmo_, não estamos vendados como em outras épocas.

 Essa nova condição da cidade socializada pela comunicação favorecerá a arquitetura polivalente, aquela que é capaz de proteger a família e também a natureza.

Cidade Global: Mercantilização do espaço e da cultura

"Poderão me opor todos os argumentos sociológicos que queiram, não deixarei de responder que todas essas diferenças de cultura, de religião, de riqueza e de poder não são senão armadilhas...” (LEVY, Pierre, 2001)

A gestão que se tem atualmente nas cidades confere respostas competitivas a todo e qualquer desafio urbano, no objetivo de torna-las um produto global. A cultura na sua polivalência é um elemento de coesão sócio-espacial e nesse sentido, o espaço ou edifício renovado manipula o entorno selecionando seus usuários, impondo seus horários, atraindo atividades comerciais e de serviços correlatas. Na cidade global, o morador não será envolvido nas escolhas, mas provavelmente será atingido por elas.

Partindo do campo global para pensar na localidade, no pedaço, o entretenimento é um desejo legítimo de qualquer cidadão. A população deseja para as suas horas de lazer, atividades locais dentro do seu universo cultural e com as cores do seu bairro. A manipulação acontece pela imposição por grupos dominantes.

A cultura como ferramenta do planejamento das cidades é parte do branding do novo negócio cujo objetivo é aumentar o valor monetário da marca e assim, valorizar a empresa ou a cidade. Um espaço valorizado atrai capitais e divisas. O sucesso de Barcelona despertou os países ascendentes ao ponto de haver projeto de lei no Brasil, proposto pelo (falecido) deputado Clodovil Hernandes, para constituir uma equipe técnica para aprender como planejar as cidades brasileiras, na Espanha. Os consultores catalães aliam o sucesso de Barcelona aos conceitos e metodologias do planejamento estratégico empresarial e tem como resultante uma cidade articulada como uma grande empresa.

Como exemplo de bom uso do espaço urbano, as bem sucedidas experiências da Inglaterra na implantação do bairro Poundbury, extensão da cidade de Dorchester, em 1989, a qual tem destaque os princípios elementares elaborados pela Foundation for the Built Environment:
1. Lugar: o projeto deve tirar partido das características que fazem com que um lugar seja único; não é bom ter um empreendimento anônimo como caráter.
2. Hierarquia: a constituição física de um edifício deve refletir sua função e sua importância.
3. Escala: os edifícios devem se relacionar com a escala de quem deles faz uso; o edifício e a dimensão de seus espaços não devem ser exageradas ou indiferentes.
4. Harmonia: um edifício deve ter individualidade não deixando de interagir com a vizinhança.
5. Limite: o espaço de controle público e o privado devem ser claramente delimitados, assim como o espaço urbano e o rural.
6. Materiais: o projeto deve utilizar materiais locais que se mesclem com a paisagem e envelheçam com dignidade.
7. Decoração: os projetos devem ser ornados com obras de artistas e de artesãos, principalmente regionais.
8. Comunidade: a comunidade local deve participar de todas as fases do projeto.
9. Espaço público: as áreas externas às edificações incluindo sinalização, iluminação artificial e o mobiliário urbano, devem pensadas e detalhadas quanto o restante do projeto.
10. Permeabilidade: o conjunto edificado deve permitir passagem através de seus volumes, facilitando o percurso de pessoas e mercadorias.
11. Durabilidade: as edificações devem ser sólidas permitindo uma vida longa, se adaptando a novos usos quando o uso anterior não mais interessar.
12. Valor: o projeto de um edifício deve considerar parâmetros econômicos.
13. Qualidade: um edifício deve ser concebido com maestria devendo refletir a qualidade da construção.

Andamos um passo atrás quando adotamos modelos de renovação urbana que reaproveitam a construção existente ou que renovam com novos edifícios em detrimento da memória histórica e cultural do lugar e da identidade de seus moradores.   Os conceitos e métodos para o resgate dos edifícios e áreas degradadas devem ser corrigidos e realinhados considerando seus recortes territoriais. Ainda pode-se pensar em fundi-los com outros métodos menos comerciais que pensam no indivíduo, no morador local.

Ainda parafraseando Pierre Levy (2001), “Não precisamos de sociólogos para nos ensinar que existe uma hierarquia social. Isso sabemos muito bem. Precisamos aprender que NÃO há nem hierarquia social, nem alto, nem baixo, e que todas as distinções NÃO tem importância. É isso que poderia verdadeiramente contribuir para mudar a sociedade."


Referência Bibliográfica:
ARANTES, Otília, VAINER, Carlos, MARICATO, Ermínia. A Cidade do Pensamento Único. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.
MAGNANI, José Guilherme Cantor. Festa no Pedaço: Cultura popular e Lazer na Cidade. São Paulo: Editora Hucitec, 1998.
LEVY, Pierre. A Conexão Planetária: O Mercado, O Ciberespaço, A Consciência. São Paulo: Editora 34, 2001.
MACEDO, Adilson Costa. O Novo Urbanismo na Europa.  (http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/08.094/158-Acesso em 01/12/2011)