Gabriela Mistral definiu a Cordilheira dos Andes como “o tórax do
corpo geográfico chileno”. Pais de paisagens diversas, o Chile guarda
sob seu território ilhas oceânicas, o deserto do Atacama e gentes mapuche¹.
Vale Nevado (autora)
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Em Santiago, o Parque Metropolitano é a principal área verde da região. Formado pelos cerros San Cristóbal, Manquehue e Bosque Santiago _que até 1921 eram terras descobertas e de muitos donos_, foi unificado e teve recompostas suas matas. Hoje é considerado o principal “pulmão” verde da metrópole, com suas árvores gigantes. Se um dia os druidas (sacerdotes celtas), tentaram recriar na arquitetura gótica suas florestas sagradas povoadas por espíritos da natureza, aqui é o retorno da ideia original. O parque é uma catedral, nesse lugar onde o céu está quase sempre encoberto pela poluição que acinzenta a atmosfera e oblitera as cores da paisagem. |
O parque ganhou além da vegetação, equipamentos que valorizam seu
potencial topográfico, como o funicular e o teleférico. O funicular é um
trenzinho que se desloca pelos trilhos na subida docerro, a caminho
da imagem da Inmaculada Concepción de la Virgen María que fica
no topo do morro, enquanto o outro vagão desce do outro lado com a força de sua
oposição.
Vista da cidade através do mirante oeste do Parque Metropolitano (autora) |
O teleférico atravessa o parque de norte a sul, com pontos de embarque e
desembarque em vários topos de montanhas. Sobrevoar o parque dentro de uma
cabine teleférica é uma situação impar, que coloca o espaço de forma integral e
reforça referencialmente a percepção do observador que se dá conta da
enormidade do parque e sua relação intrínseca com a cidade.
Vista do parque e da cidade através do teleférico (autora)
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Os marcos visuais do parque são da cultura Mapuche, que possui uma cosmovisão integral muito própria, onde a natureza e o homem conformam conceitualmente uma unidade. Menos presente no léxico do castelhano local, o quechua awqa aparece nomeando zonas, ruas, equipamentos e lugares públicos e alguns relativos à fauna e a flora autóctones. Em 1932, Gabriela Mistral descreveu a importância do início das obras do San Cristóbal, no sentido de ter colocado no mesmo nível de importância o Conquistador Don Pedro de Valdívia e o Cacique Toqui Vencido ou Caupolicán, principal herói de La Araucana do poema épico de Alonso de Ercilla y Zúñiga. |
“A raça é mais espanhola que aborígene, pela glorificação que o índio
magnifico significa para nós, em vez de censura rancorosa de uma derrota, a
lição soberana de defesa do território é obra de um espólio eterno da dignidade
nacional. La Araucana, que para muitos segue como sendo de centauros das
ordens, romanos e índios para os chilenos, no passado é um duplo testemunho,
paterno e materno, da força do sangue, aplacadas e unificadas em nós mesmos.”(MISTRAL, 1957)
A abrangência da herança histórica está entremeada entre apelos
materiais e principalmente imateriais, na geografia do lugar. A cultura
chilena, pela carga cognitiva e identitária que possui, impregna essas
paisagens que reforçam ainda mais a identidade local.
¹ No dialeto quechua awqa, Mapuche significa
“terra da gente”.
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